A Ciência está considerando os animais como mercadorias?
Luís de Andrade Martini
Quinhentos milhões de animais são usados todos os anos no mundo em experimentos tidos como científicos. Esta é apenas uma estimativa bastante conservadora , pois os números podem ser ainda mais expressivos. Estaria o ser humano cometendo um erro moral histórico ao usar os animais em experimentos, assim como já cometeu em subjugar outros seres humanos a escravidão? Sexismo e racismo são exemplos de preconceitos de grupos circunstancialmente no poder em relação a outros grupos. Estes grupos poderosos atribuem valores a características irrelevantes, geralmente físicas ou biológicas (sexo, cor, idade, etc), que somente eles possuem e desta maneira tentam impor a idéia de que não possuir esta característica faz do outro grupo um grupo sem nenhum valor. Algo sem valor é algo que não merece consideração moral e se não merece consideração moral, podemos fazer deste algo o que quisermos.
Crianças, mulheres e algumas etnias já foram considerados mero objetos, coisas ou mercadorias no decorrer da história. E os animais, como eles têm sido considerados moralmente por nós? Especismo é uma forma de preconceito e discriminação baseada na diferença entre as espécies. Pressupõe que os interesses de um indivíduo são de menor importância pelo mero fato de se pertencer a uma determinada espécie. É justo usar animais como meras coisas? Eles têm valor inerente, ainda que experimentadores tentem negar isto e somente os vejam de acordo com os interesses humanos, ou seja pelo seu valor extrínseco e condicional, assim como por ex. os escravos têm valor apenas na medida em que podem satisfazer os desejos e serem usados pelos seus senhores e não pela sua condição essencial de seres humanos que são (valor inerente).
Usar animais não humanos prejudicialmente em experimentos científicos é moralmente errado. Se somos semelhantes física e psicologicamente a eles e se tanto os seres humanos como os animais possuem uma característica essencial e comum que é a senciência (um ser senciente é aquele capaz de sentir dor, sofrimento e alegria) e se seres humanos atribuem direitos fundamentais a si próprios como o direito a vida, a integridade física e a liberdade, somos obrigados moralmente a atribuir estes mesmos direitos básicos aos animais não humanos. De acordo com o princípio da justiça que nos outorga a igual consideração de interesses a seres semelhantes, não temos o direito de usar prejudicialmente os animais em experimentos científicos. Animais não humanos não estão interessados em serem voluntários de experiências que envolvem dor e sofrimento. Proteger o seu interesse independentemente de isto produzir, ou não, conseqüências desejáveis é reconhecer o seu valor inerente.
Todo os seres sencientes sejam eles crianças ou outras espécies animais têm o direito de desenvolver a sua própria natureza , violar este direito é destruir o ser. De acordo com o princípio da vulnerabilidade, quanto mais frágil é um ser, mais proteção ele deve ter para que sejam garantidos os seus direitos. Não há nenhuma justificativa moral para infligir sofrimento e dor a outras espécies animais mais vulneráveis do que a nossa. Ao contrário deveríamos protegê-las. A questão central e moral é portanto o não uso dos animais como se fossem mercadorias, mas experimentadores têm desviado o foco de atenção da sociedade para uma melhoria no tratamento dos animais e regulamentações do seu uso como este pretenso projeto de lei, P.L. Arouca. Explorados continuam sendo explorados, escravos continuam sendo escravos mesmo se o colocarmos em espaços maiores e arejados. A condição de escravidão e exploração dos animais é que deve ser discutida amplamente pela sociedade e nenhuma lei deve ser imposta desta maneira arbitrária, pois corre o risco de se tornar um ato antidemocrático.
Luís de Andrade Martini é psicólogo e professor de psicologia do curso de pós-graduação do Instituto Sedes Sapientiae de São Paulo, onde também exerce as funções de supervisor de estágios e orientador de pesquisas científicas.
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